Tinha 12 anos quando cheguei. Estávamos em 1979 e Portugal à essa época parecia um país subdesenvolvido para quem tinha crescido na América do Norte. Tal mudança poderia ter sido um choque e comprometer um recomeço de vida em terra estranha. Mas o acolhimento caloroso daqueles que conheci neste pedaço de terra solarengo à beira mar suprimiu todas as lacunas que aqui encontrei.
Era o meu primeiro dia de escola e não fazia ideia da escola para onde ia. Sabia que era um colégio, mais nada! E sabia também que era o melhor sítio para se ter um filho a estudar. Vi meus pais ao chegar preocupados em saber onde deixar a filha nesta terra onde o ensino público tinha tão má reputação. Recordo-me que estava cheia de medo porque donde eu vinha a discriminação era-me bem familiar e se lá me punham de parte por ser portuguesa, cá, imaginava que fariam o mesmo por ser... canadiana! Mas logo percebi que a alma desta gente, a nossa gente, era tão diferente. Assim que fui apresentada um turbilhaõzinho de miúdos rodearam-me curiosos ávidos de saberem tudo sobre mim. Eu dominava mal, muito mal, a língua portuguesa. Mas nem isso colocou barreiras. Era vê-los a esforçarem-se para serem entendidos mas sobretudo para me ajudarem a comunicar. Assim como muitos momentos divertidos com as expressões que "ajustava" numa tradução directa do francês para o português e que provocavam muitos risos. Há duas palavras que jamais esqueço e que aprendi com eles: o "concordas?" e o "percebes?". O primeiro porque a única palavra similar que conhecia era o avião "concorde". A segunda que só depois de arranjarem o sinónimo "entendes?" fez nascer luz dentro da minha cabeça.
O colégio era um edifício velho, muito velho onde nalgumas partes havia pedaços de tecto que caiam. A minha sala era no topo da escadaria, no último andar. Pequena, com mesas de madeira que denunciavam a passagem de muitos anos, todas rabiscadas, um quadro de lousa pequeno e uma janela pouco maior que um postigo, contrastavam com a recordação que tinha das salas por onde tinha andado, amplas, cheias de luz, quadros imensos e mesas ergonómicas. Cá em baixo na entrada, à esquerda, era a secretaria. O hall era secular e no topo, a escadaria que nos levava ao primeiro andar. Ali, depois de atravessar um corredor, ao fundo, o refeitório, onde se destacava uma mesa rectangular comprida destinada aos professores, rodeada por outras redondas onde, por grupos de 4, nos juntávamos para almoçar. Recordo dois pratos que nunca comera e que adorava: massa esparguete com frango e rancho. No rés de chão, o ginásio. Pouco maior que uma grande sala de aula americana, muito pobre em equipamento desportivo, era lá que em dias de chuva nos reuniamos para a aula de educação física. Quando o tempo o permitia, saltávamos para o exterior onde se encontrava o campo de futebol que só assim o denominávamos por ter duas balizas. Do outro lado oposto, numa pequena área coberta, ainda no exterior, enquanto os rapazes exibiam seus dotes de futuros futebolistas no campo, as meninas deliciavam-se a jogar handball. As aulas de trabalhos manuais eram num anexo no exterior. Frio, húmido, aí dávamos vida às nossas criações onde a memória me leva até aos "macramés" e onde aproveitávamos todos os minutos da aula com entusiasmo para ver nascer a obra.
Vivíamos com intensidade cada dia ali. Não sei se por sermos poucos e a mesma turma nos acompanhar todos os anos até concluir o último grau. Se por não podermos sair quando havia um "furo" impedidos de fugir à sucapa pelo Sr. Amândio, sempre atento às nossas investidas, e sermos obrigados a criar actividades para nos entreter. Daí os cânticos em qualquer canto do colégio, os jogos das prendinhas onde experimentamos os primeiros beijos, as aulas práticas de maquilhagem na casa de banho onde perdíamos horas no espelho a experimentar visuais novos. Ou simplesmente a conviver na porta de entrada, ali alinhados nos degraus, para desespero dos padres que não nos queriam ali... Ah! E os padres, tão únicos e peculiares: o Fonseca que dava aulas de matemática e físico-química introduzindo uma anedota aqui e acolá que nos prendia a atenção só para não correremos o risco de perder as gargalhadas garantidas; o Freire que contava a História com paixão em vez de a ensinar; e até o Miguel que todos temiam por ter mão pesada nos castigos!
Havia naquele lugar algo de mágico, único que sem sabermos ficaria registado dentro de nós para toda a vida. Ficamos eternamente ligados como um cordão umbilical que une mãe e filho, presos por uma terna lembrança de um colégio que não se apaga da memória. Um grupo de gente que faz parte de nós... Uma segunda família.
Dedico estes post a todos os meus colegas do Colégio do Minho de 1979
Vivíamos com intensidade cada dia ali. Não sei se por sermos poucos e a mesma turma nos acompanhar todos os anos até concluir o último grau. Se por não podermos sair quando havia um "furo" impedidos de fugir à sucapa pelo Sr. Amândio, sempre atento às nossas investidas, e sermos obrigados a criar actividades para nos entreter. Daí os cânticos em qualquer canto do colégio, os jogos das prendinhas onde experimentamos os primeiros beijos, as aulas práticas de maquilhagem na casa de banho onde perdíamos horas no espelho a experimentar visuais novos. Ou simplesmente a conviver na porta de entrada, ali alinhados nos degraus, para desespero dos padres que não nos queriam ali... Ah! E os padres, tão únicos e peculiares: o Fonseca que dava aulas de matemática e físico-química introduzindo uma anedota aqui e acolá que nos prendia a atenção só para não correremos o risco de perder as gargalhadas garantidas; o Freire que contava a História com paixão em vez de a ensinar; e até o Miguel que todos temiam por ter mão pesada nos castigos!
Havia naquele lugar algo de mágico, único que sem sabermos ficaria registado dentro de nós para toda a vida. Ficamos eternamente ligados como um cordão umbilical que une mãe e filho, presos por uma terna lembrança de um colégio que não se apaga da memória. Um grupo de gente que faz parte de nós... Uma segunda família.
Dedico estes post a todos os meus colegas do Colégio do Minho de 1979
Olá Cristina! Eu andei no de S. José que era nessa altura o feminino. bons colégios, mesmo sem equipamento de soberba. Eu fiz lá o 9º. ano, e depois saí para ir trabalhar. Mais tarde, fui para o Charles Pierre, em Lisboa, para fazer o 12º. como estudante trabalhadora.
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