É deveras curiosa esta doença do meu pai. Quando tudo indicava que ele estaria a evoluir na enfermidade com sinais evidentes de uma progressão profunda e sem retorno, e eis que a reviravolta se dá com se de um milagre se tratasse. Preso a uma cama, sem sorrisos, sem falas, com os dias passando recuperou todo o vigor que perdera. Sorrisos largos e esplendorosos são o cartão de visita para quem chega. E ai! que saudades eu tinha desse riso aberto e caloroso! Dessa gargalhada, embora tímida, que já não se ouvia há tanto tempo! E ele que não se mexia para nada, é vê-lo a andar todo hirto em direcção à casa de banho quando a natureza o chama! Qual fraldas qual quê! Estão lá só para garantir que não há descuidos... Passeia-se pela casa, vai até ao quintal e volta todo satisfeito depois de se assegurar que o seu carro continua na garagem. Aquele mesmo carro com o qual matava o desejo de uma paixão: conduzir. Não recuperou totalmente a fala, o raciocínio. Parece que o cérebro não quer de todo acompanhar o corpo nesta magnífica evolução. Mas há melhoras significativas. Curiosamente lembra-se mais vezes ao dia das pessoas que o rodeiam. E tem rasgos de lucidez impressionantes que, sem querer, nos levam quase a acreditar que ele um dia acordará dizendo: "Ei, pessoal! Regressei ao Mundo dos lúcidos!!" Tenho dias, confesso, em que quero acreditar nisso. Afinal não há gente que volta a andar? Porque não haveria um milagre assim para o meu pai...
Há um retrocesso na doença. Disso não tenho dúvida. É como se ela tivesse sido adiada, por tempo indeterminado. E inevitavelmente, dou por mim a pensar como seria bom, se fosse possível, este processo voltar a trazer o pai que perdi...
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