Foi o destino que me trouxe àquela hora. Até porque a consulta era só às quatro da tarde. Mas tinha coisas para fazer a pedido da minha mãe e decidi ir mais cedo... Ao aproximar-me da casa dos meus pais sinto alguém a correr. Pensei de imediato que seria meu filho que regressava da escola mas de repente, um estrondo na garagem que não podia ser de uma criança, fez-me temer o pior: meu pai acabara de cair com violência. Apresso o passo e assim que o avisto, de cara completamente colada ao chão, ensopado em sangue, imóvel e sem fala, tento a todo o custo que ele reaja à minha presença tentando ao mesmo tempo levantá-lo. "Pai, estás bem?! Fala comigo!" Levantei-lhe a cabeça, depois o corpo, pesado e morto sem que proferisse uma palavra, um gemido. "Pai, fala comigo! Consegues andar?!" Sem resposta, chamo pela minha mãe na esperança que ela me ouvisse: "Mãe estás aí?!! Ajuda-me, o pai caiu e feriu-se..." Amparado pelas duas, foi até ao seu lugar de sempre: o sofá.
Já com a maleta dos primeiros socorros, trato-lhe das feridas com todo o carinho e cautela para não o magoar. Nos cantos dos olhos, encontro duas lágrimas teimosas que caem... "Tens dores pai?! Mas ele não responde. "Deixa-me ver a boca por dentro, estás a sangrar muito..." A muito custo obedeceu. As minhas suspeitas estavam certas: tinha um golpe profundo no lábio inferior. Depois dos curativos deitei-o e fiquei durante uns largos minutos a contemplá-lo. O meu pai, outrora tão forte e cheio de vida estava ali tão indefeso, tão frágil. A doença está a levá-lo a cada dia que passa sem dó nem piedade sugando-lhe a pouca autonomia que ainda lhe restava.
Virou-se um capítulo. Ainda ontem dava as suas voltinhas pelo quintal sem merecer cuidados. Hoje, só amparado para não cair...
Sinais que nos dizem que a próxima etapa está perto... demasiado perto...
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