sexta-feira, 14 de agosto de 2015

AMOR FIRME

Não há drogas leves nem pesadas. O que há são classificações atribuídas a essas substâncias que as tornam legais ou ilícitas. Porque drogas são sempre drogas, sejam vendidas nas farmácias ou na rua. E começa aqui o primeiro grande obstáculo ao reconhecimento deste problema: a negação. Porque nos é dito que é medicamento. Porque nos é dito que haxixe é droga leve, queremos acreditar que não há problema. Que é apenas uma questão de tabus levantados por uma sociedade retrógrada. Para percebermos mais tarde que afinal, droga é sempre droga. É adicção. É dependência. É a morte premeditada. É o princípio do fim da nossa liberdade. Depois pensamos que estas coisas só acontecem aos outros. Que é preciso "nascer-se" predisposto. Que é preciso pertencer a um grupo marginal. Que é preciso estar mergulhado numa depressão, para que a droga entre nas nossas vidas. Até que um dia descobrimos que não é assim...

Naquela madrugada estava decidida acabar com tudo. Estava farta daquele temperamento inconstante. Daquelas ausências sem explicação. E no momento em que me preparava para lhe dar a notícia, eis que ele me surpreende com a revelação fatal: era adicto a drogas. De repente o meu chão sumiu. Paralisada na penumbra da cozinha, ouvia silenciosamente aquele relato emocionado de quem pedia ajuda desesperada. Ninguém jamais está preparado. Nem uma bomba conseguiria tamanho estrago de alma. A devastação da notícia consumiu-me. E agora? 

Teria sido mais fácil deixá-lo logo ali. Virar costas e seguir minha vida. O problema é o amor. Quando se ama alguém profundamente, virar costas é a última coisa que se quer. Porém, estava longe de imaginar que, ao aceitar ajudá-lo, estava a abraçar o maior e mais doloroso desafio da minha vida. E foi. Foi a experiência mais traumática, mais dura, mais violenta que vivi. O pior foi pensar que conseguiria dar conta de tudo sozinha. Até vir o colapso final demonstrando que estas batalhas não se travam sem ajudas de todos. 

Foi  preciso muito amor firme para dar conta deste nefasto mal. Amor carregado de corajosos "nãos" e ultimatos sem saber que reacções viriam depois. Amor feito de muita lágrima e revolta sem desistir. Amor de raiva sem perder o rumo, sem deixar de segurar a mão de quem caminha lentamente para a morte. Amor que semeia esperança naquele que já a perdeu e se recusa a viver. Amor firme de quem ama incondicionalmente e quer resgatar quem já se foi, trazer à tona quem mergulhou fundo e tarda a vir à superfície.

Aprendi na carne que drogas, não importa a classificação que se queira dar são sempre nefastas. Que destroem cerebralmente quem as toma e que, mesmo o negando, criam adição. Que é fácil partir da mais "leve" para a mais dura. E que basta tocar numa delas para já não conseguir viver sem ela. Que a única forma de se manter imune, é nunca tocar em nenhuma delas por muito inofensiva que pareça. Todos entram quando querem, mas só saem quando podem.

Mais do que tudo, só o amor firme da família, de amigos ou companheiros de vida resgatam esses seres do abismo.





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