segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

À NOITE NO MECO



Um grupo de jovens aluga uma casa, vestem-se a rigor e dirigem-se à praia naquilo que tudo indica ter sido um ritual de praxe académica. Aproximam-se das ondas e são engolidos por elas... Um sobrevivente seguido de um silêncio ensurdecedor, não explica nem diz nada. Fecha-se em casa como se tivesse direito a negar respostas a quem numa noite vê ceifada a vida de um filho. 

Percebo a angústia de quem inesperadamente vê a tragédia acontecer mesmo em frente aos seus olhos. Percebo o choque de ver tantos amigos a serem arrastados em noite escura. Eu entendo que não deva ser fácil sequer pronunciar os nomes deles. Mas consegue alguém ficar amordaçado por episódio tão brutal ao ver a dor cravada nos rostos dos pais órfãos?  

Não se trata de julgar ninguém até porque, repito, são episódios tão dolorosos para quem presenciou como para quem perdeu alguém no mar. Mas parece-me que os nossos jovens perderam valores tão importantes que os torna vazios e sem carácter. E os pais? Que fazem eles para ajudar realmente o filho? Com que consciência viverão eles o resto da vida? 

Este episódio faz-me lembrar um que vivi de perto há já alguns anos. Por um lado estava um familiar, por outro, a família da vítima de quem eu era amiga. Foi-me pedido ajuda porque a mãe andava desesperada e só queria saber o que lhe tinham feito à filha. O sofrimento daquela mãe rasgava-me por dentro. Ela só queria respostas. Mas ninguém lhas deu. Até hoje não sabe do paradeiro da filha. Também não lhe pode fazer o luto mesmo sabendo que ela nunca poderia estar hoje viva... Mas apesar dos apelos que ela tanto fez para sensibilizá-los, o silêncio foi o caminho encontrado para escamotear a verdade. Tudo isto apenas porque supostamente alguém queria proteger um filho de ser apresentado à justiça. Porque entende-se que vale tudo só para evitar que se saiba, que se conste, que se fale no assunto. Esconder dos outros mentindo parece ser mais correcto do que entregar a verdade a uma mãe destruída pela dor. Porém, ninguém na freguesia tem dúvidas sobre a culpabilidade nem mesmo a judiciária. Vale a pena pagar com a consciência um episódio que nos atormentará para o resto das nossas vidas em detrimento de, pelo melhor ou pior, viver tranquilo e de acordo com os valores humanos?   

Quando se tem um carácter deformado o caminho da mentira é o mais sedutor. A cobardia de enfrentar o outro lado, e por muito que custe, falar com dignidade sobre os factos de que nos acusam, traz ao de cima o que de pior tem o ser humano: egoísmo. 

Por cá, também já se viveu nos limites. E quando falo, faço-o com conhecimento de causa. Infelizmente. Porque não basta apontar aos outros, é preciso ser-se um exemplo do que se afirma. E nós, ao contrário destes, quando as pessoas comentem actos graves, quando erram e comprometem a vida dos outros, não nos escondemos, não nos coibimos de resolver no local certo as questões sejam elas depois do domínio público ou não. Não temos medo porque não somos criminosos e logo, a justiça vem ao nosso encontro. Não fugimos. Não mentimos. Não escondemos. E as pessoas envolvidas por muito que as amemos acabam por compreender que esse foi o caminho certo porque a vida depois acaba por devolver em dobro o  bem feito aos outros... E as consciências tranquilas e em paz porque foi feito o que tinha de ser feito. 

O silêncio do Meco poderá impedir a justiça de repor a verdade mas jamais deixará viver quem dos seus deveres se demitiu... 


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