Enquanto remexia numa caixa do passado, encontro uma carta dirigida ao meu tio. Ao lê-la, as memorias reavivavam e novamente a revolta tomava conta de mim. Na carta, uma das irmãs acusava esta minha tia de ser a causa do afastamento dos irmãos. Mas como é possível de forma tão brejeira, acusar alguém quando se sabe que o cerne dos desentendimentos cabe à responsabilidade apenas e somente a cada um deles? Fico estupefacta com a audácia de alguns que não se coíbem de dizer, não importa o quê só para justificar os seus falhanços interpessoais. Na verdade, não há ninguém que sozinho seja responsável por tamanha balbúria de intrigas e amargos de boca.
É preciso recuar-se no tempo para perceber quem é esta minha tia e porque a condenam. Quando se conheceram, ela e meu tio eram muitíssimo novos. Casaram cedo e contra a vontade do meu avô que não queria na família uma francesa. Mas o amor por esta mulher falou mais alto. Meu tio sempre foi um homem atraente que facilmente se fazia rodear de atenções femininas. E minha tia, como qualquer mulher que ama intensamente, tentava proteger o que era seu. Um começo de vida de casados um pouco atribulada fizeram com que nascessem inseguranças por parte dela que logo soube colmatar, não o perdendo nem um minuto de vista, indo para todo o lado na sua companhia. É verdade que ela não mostrava satisfação quando os homens da família combinavam saídas sozinhos. E também, que usava todas as suas armas femininas para o demover. Mas não seremos todas um pouco assim?
A verdade é que, mesmo sem o pronunciarem abertamente sentia-se no ar o incómodo que esta mulher provocava no seio da família. Facilmente se ouvia algum a referir-se a ela como a francesa em vez do nome. Um certo desdém por alguém que acima de tudo primava pela diferença. O embaraço terá surgido muito cedo. Ela, francesa de gema, esbelta e bem vestida na moda daquela época, contrastava junto das portuguesas de estilo provinciano num país fechado ao mundo pela ditadura. O estilo e beleza terá encantado meu tio e o amor que este lhe dedicava, incomodado quem com eles privava...
É certo que nem tudo nela será virtude e tal como nós, terá o seu lado lunar. Eu, apesar de gostar muito dela, também tive as minhas decepções, porém facilmente perdoáveis num universo de real bondade que ela possui e me dedicou. E de facto se ela não fosse uma pessoa com grandes qualidades humanas, minha avó de quem se tornou muito amiga, nunca a teria feito confidente e sua cúmplice. Graças a esta minha tia, a minha avó encontrou o ombro, e o único, que tanto precisava e sobretudo alguém que não temeu enfrentar o tirano do meu avô por diversas vezes. Os laços afectivos eram tão intensos que, assim que soube que eles teriam de partir de novo, deixando-a novamente sozinha, minha avó mergulhou numa tristeza profunda. Acusaram-na (por ignorância) de nem aos seus ela acudir. Uma falsidade tão grande quanto outras tantas ditas à toa. De facto minha tia teve cá sua mãe. Cuidou dela mas... a ingratidão dessa senhora e génio malvado fez com que tomassem a decisão de a levar de volta a França. E minha tia paterna mais nova, que ousou pronunciar-se contra eles, acabaria por constatar, ao meter-se onde não era chamada, que afinal eles estavam cobertos de razões para actuarem daquela forma. Mas infelizmente, daquele lado, reina a amnésia...
Quando iniciei o meu processo de divórcio, ela telefonou-me lavada em lágrimas, em sofrimento perguntava o que se tinha passado e pedia para ter calma. Mais tarde e já divorciada, esta mulher, ao contrário de todas as restantes da família, nunca me viu como uma adversária, "aceitou-me" de volta sem me marginalizar, sem me apontar nada e de braços abertos e sinceros fez-me parte do seu mundo. Foi a única que depois do meu divórcio novelesco quis saber por mim o que realmente se tinha passado. E acabou por me revelar todos os comentários que tinham circulado durante esses dois anos do meu afastamento. Em pouco tempo tornámo-nos muito amigas partilhando tudo e mais alguma coisa. Confiava nela e nunca mas nunca tive um motivo que me alertasse para ter cautela. Ela é genuina, sincera e sensível e por isso poucos conseguem compreendê-la.
Fui depois convidada por 2 vezes a passar umas férias em França junto deles. Ela levantava-se às 6h da manhã para ir comprar croissants quentinhos, a sair do forno para o meu pequeno almoço só porque lhe tinha confidenciado que adorava... croissants! Deixou de trabalhar 1 semana apenas para poder estar comigo e levar-me a desfrutar da cidade e levar-me a passear... Dormia na sala com meu tio enquanto me acomodava no seu quarto. Cobria-me de mimos não se coibindo dos gastos só para me ver feliz e proporcionar-me as melhores férias da minha vida. Ela sabia que eu nunca tinha viajado, ela sabia que nunca tinha tirado férias. Tudo o que ela queria era tornar esses momentos inesquecíveis. E conseguiu.
Ainda hoje, não esqueço o apoio que ela dá à minha mãe sempre que ela precisa. Sabendo-a sozinha com o meu pai incapacitado, ao mais pequeno pedido, ela acorre imediatamente contrariando completamente o perfil que fazem dela.
Eu sei que para algumas mulheres não é fácil compreender o amor de um homem por uma mulher assim. Mal amadas, resistem a ver e se vêem logo arranjam forma de o destruir. Meu tio optou cedo por defendê-la e apoia-la acima de tudo porque cedo constatou que era a única pessoa leal e sincera que lhe valeria na vida. Os outros, que tanto se auto-intitulam de fraternos e amigos são pessoas vãs cujos afectos não resistem sequer a coisas tão simples como o ter opinião diferente às suas. São gente que sorri muito mas só até nos afastar-mos. Percebeu que são gente que não aceita nem respeita um "não" e partilham valores diferentes aos seus. Mas acima de tudo percebeu que não a aceitavam, que não a amavam e por isso ao longo dos anos quis afastar-se para defender a sua princesa.
Que venha agora o primeiro e lhe atire uma pedra...
A verdade é que, mesmo sem o pronunciarem abertamente sentia-se no ar o incómodo que esta mulher provocava no seio da família. Facilmente se ouvia algum a referir-se a ela como a francesa em vez do nome. Um certo desdém por alguém que acima de tudo primava pela diferença. O embaraço terá surgido muito cedo. Ela, francesa de gema, esbelta e bem vestida na moda daquela época, contrastava junto das portuguesas de estilo provinciano num país fechado ao mundo pela ditadura. O estilo e beleza terá encantado meu tio e o amor que este lhe dedicava, incomodado quem com eles privava...
É certo que nem tudo nela será virtude e tal como nós, terá o seu lado lunar. Eu, apesar de gostar muito dela, também tive as minhas decepções, porém facilmente perdoáveis num universo de real bondade que ela possui e me dedicou. E de facto se ela não fosse uma pessoa com grandes qualidades humanas, minha avó de quem se tornou muito amiga, nunca a teria feito confidente e sua cúmplice. Graças a esta minha tia, a minha avó encontrou o ombro, e o único, que tanto precisava e sobretudo alguém que não temeu enfrentar o tirano do meu avô por diversas vezes. Os laços afectivos eram tão intensos que, assim que soube que eles teriam de partir de novo, deixando-a novamente sozinha, minha avó mergulhou numa tristeza profunda. Acusaram-na (por ignorância) de nem aos seus ela acudir. Uma falsidade tão grande quanto outras tantas ditas à toa. De facto minha tia teve cá sua mãe. Cuidou dela mas... a ingratidão dessa senhora e génio malvado fez com que tomassem a decisão de a levar de volta a França. E minha tia paterna mais nova, que ousou pronunciar-se contra eles, acabaria por constatar, ao meter-se onde não era chamada, que afinal eles estavam cobertos de razões para actuarem daquela forma. Mas infelizmente, daquele lado, reina a amnésia...
Quando iniciei o meu processo de divórcio, ela telefonou-me lavada em lágrimas, em sofrimento perguntava o que se tinha passado e pedia para ter calma. Mais tarde e já divorciada, esta mulher, ao contrário de todas as restantes da família, nunca me viu como uma adversária, "aceitou-me" de volta sem me marginalizar, sem me apontar nada e de braços abertos e sinceros fez-me parte do seu mundo. Foi a única que depois do meu divórcio novelesco quis saber por mim o que realmente se tinha passado. E acabou por me revelar todos os comentários que tinham circulado durante esses dois anos do meu afastamento. Em pouco tempo tornámo-nos muito amigas partilhando tudo e mais alguma coisa. Confiava nela e nunca mas nunca tive um motivo que me alertasse para ter cautela. Ela é genuina, sincera e sensível e por isso poucos conseguem compreendê-la.
Fui depois convidada por 2 vezes a passar umas férias em França junto deles. Ela levantava-se às 6h da manhã para ir comprar croissants quentinhos, a sair do forno para o meu pequeno almoço só porque lhe tinha confidenciado que adorava... croissants! Deixou de trabalhar 1 semana apenas para poder estar comigo e levar-me a desfrutar da cidade e levar-me a passear... Dormia na sala com meu tio enquanto me acomodava no seu quarto. Cobria-me de mimos não se coibindo dos gastos só para me ver feliz e proporcionar-me as melhores férias da minha vida. Ela sabia que eu nunca tinha viajado, ela sabia que nunca tinha tirado férias. Tudo o que ela queria era tornar esses momentos inesquecíveis. E conseguiu.
Ainda hoje, não esqueço o apoio que ela dá à minha mãe sempre que ela precisa. Sabendo-a sozinha com o meu pai incapacitado, ao mais pequeno pedido, ela acorre imediatamente contrariando completamente o perfil que fazem dela.
Eu sei que para algumas mulheres não é fácil compreender o amor de um homem por uma mulher assim. Mal amadas, resistem a ver e se vêem logo arranjam forma de o destruir. Meu tio optou cedo por defendê-la e apoia-la acima de tudo porque cedo constatou que era a única pessoa leal e sincera que lhe valeria na vida. Os outros, que tanto se auto-intitulam de fraternos e amigos são pessoas vãs cujos afectos não resistem sequer a coisas tão simples como o ter opinião diferente às suas. São gente que sorri muito mas só até nos afastar-mos. Percebeu que são gente que não aceita nem respeita um "não" e partilham valores diferentes aos seus. Mas acima de tudo percebeu que não a aceitavam, que não a amavam e por isso ao longo dos anos quis afastar-se para defender a sua princesa.
Que venha agora o primeiro e lhe atire uma pedra...
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